segunda-feira, 25 de junho de 2012

Dislexia parte 2: Afasia.

Qual a distância entre uma palavra e aquilo que ela tenta dizer? Qual a distância entre o que se diz e o que se ouve? O mal entendido é constante, desencontros, brigas, disses e não disses. Diante das palavras fica realmente difícil saber se fomos compreendidos, e a probabilidade mostra que é mais frequente que não sejamos. Queremos nos expressar, comunicar o que sentimos, mas falando, pouco ou nada é compreendido. Então, por que falar?

Usamos a palavra para nos remeter a realidade, a palavra jamais é a coisa a que se refere, na maioria das vezes nem se parece! Sabemos disso e mesmo assim tomamos a palavra como a própria realidade. Até mesmo por que, confiamos muito mais no que escutamos do que no que vemos e menos ainda no que sentimos.

“Ver é mais importante do que falar, e ficar falando é uma excelente maneira de mal perceber o que estou vendo. Isto é: se estivermos atentos às palavras, mal veremos, por exemplo, os gestos e as expressões faciais do interlocutor.” (Gaiarsa, Meio século de psicoterapia verbal e corporal)

Usamos a palavra para criar leis fundamentais, morais intransigentes. Usamos a palavra para produzir diagnósticos, taxamos identidades imutáveis, classes, categorias, conceitos, conceitos e mais conceitos. E esquecemos que são “só” palavras... nós começamos a servir aquilo que deveria ter sido pra nós um instrumento.

“O homem criador dos signos não era modesto a ponto de aceitar que apenas nomeava, ele precisou acreditar que com as palavras adquiriria saber sobre as coisas”
(Viviane mosé)

A palavra nivela, iguala, exclui as diferenças, as possibilidades e a pluralidade inerente ao viver. Chama de igual àquilo que é múltiplo e a isso atribui um valor de verdade. Mesmo que este valor surja da necessidade de acordos, de comunicação, esquecemos que estes valores são móveis e mutáveis. O genérico facilita a comunicação, “os significados das palavras são estatísticos”, mal usado, no entanto, constitui a base dos preconceitos, “pais são assim” , mulheres são assado” quando eu falo “mulher”, você entende o que eu quero dizer, mesmo sabendo que não existe “a mulher” e que todas as mulheres são incomparavelmente únicas.

“A linguagem é produto da necessidade psicológica de exclusão das diferenças, da vontade de nivelamento e redução, do medo da pluralidade e do conflito. Ao invés de uma convenção necessária, capaz de aumentar o poder de atuação do homem no mundo, a palavra se tornou o sinônimo das coisas. mais do que isso, a crença na correspondência entre as palavras e as coisas terminou por sustentar a vontade de negação da vida, que, ao contrário da convenção dos signos, é mudança, conflito, imprevisibilidade, desconhecimento. Ao impor a todo enunciado a sua lógica de identidade, a linguagem produziu a ficção de duração, de estabilidade, de verdade do mundo.” (Viviane Mosé, Nietzsche e a grande politica da linguagem.)

Sem dúvida, as palavras são limites, e para permanecer preso a elas é necessário um esforço de esquecimento, confiar nas palavras é desconsiderar o múltiplo, o caótico e o impermanente do viver. “Nomear é impor identidade ao múltiplo, ao móvel, é forjar uma unidade que a pluralidade das coisas não apresenta. A palavra, por juntar coisas distintas em um único signo, se sustenta na negação da diferença.” (Idem.)

 Nosso próprio raciocínio está aprisionado no marchar lento de uma frase, quando pensamos em palavras, tendemos a seguir a ordem necessária para falar, uma palavra atrás da outra, lento demais, limitado demais. “A linguagem formata o nosso pensamento” mas será que precisa? Eu penso de outra forma e talvez seja daí que venha minha dislexia... Podemos pensar em pulos, fora de linhas, na velocidade de quem olha, o campo visual não segue uma linha, uma pintura não tem começo nem fim...


Eu sei que nada tenho a dizer,
Mas acabei dizendo sem querer
Palavra bandida!
Sempre arruma um jeito de escapar (hum!)

Seria tudo muito melhor
Se a música falasse por si só
Dá raiva da vida
Nada existe sem classificar (não!)

Penso, tento
Achar palavras pro meu sentimento
Tanto é pouco, nada diz
Não é triste, nem feliz

Mesmo sendo
Um pranto, um choro ou qualquer lamento
Nada importa, tanto faz
Se é pra sempre ou nunca mais

Pensei em mil palavras, e enfim
Nenhuma das palavras coube em mim
Não vejo saída
Como vou dizer sem me calar?

Diria mudo tudo o que faz
Minha vida andar de frente para trás
Uma frase perdida
Num discurso feito de olhar

Penso, tento
Achar palavras pro meu sentimento
Tanto é pouco, nada diz
Não é triste, nem feliz

Mesmo sendo
Um pranto, um choro ou qualquer lamento
Nada importa, tanto faz
Se é pra sempre ou nunca mais

Não é medo, nem é riso
Não é raso, não é pouco, nem é oco
Não é fato, nem é mito
Não é raro, não é tolo, não é louco
Não é isso, não é rouco
Não é fraco, não é dito, não é morto
Não, não, não, não!

Eu sei que nada tenho a dizer
Pensei em mil palavras, e enfim
Seria tudo muito melhor
Pensei
Seria
Se um dia alguém puder me entender

                                                             Móveis Colonias de Acaju.

Nenhum comentário:

Postar um comentário