terça-feira, 28 de maio de 2013

Acoplamento estrutural. Parte 1: Registro

Sempre gostei de fotografar, no entanto, nos eventos mais importantes eu fazia questão de não levar câmera alguma, considerava o dispositivo um empecilho ao acolhimento da experiência. Sempre impliquei com as pessoas que vão em shows, exposições, os mais belos espetáculos, e passam a maior parte do tempo preocupados em filmar/fotografar com seus celulares/câmeras para o alto sustentados em posições esdruxulas. Penso que a maioria das pessoas talvez ache melhor mostrar que foi ao show do que realmente ter vivido o acontecimento. A experiência é perdida em detrimento de um registro pobre cuja única utilidade é servir de vitrine e comprovar o comparecimento.

Estava dividido, ou registrava digitalmente, ou vivia (registrando corporalmente). E esta divisão eu vivia com uma angústia adicional, quando calhar o registro, como fazer disso mais do que um comprovante? Sempre procurei fazer do registro uma obra-de-arte, mas se eu só registrava os eventos sem importância, eu não era capaz de me afetar o suficiente para converter o fluxo documental em um fluxo artístico.
O dilema me pressiona então a levar os equipamentos a eventos significativos. Mas como?  Como erguer aparelhos, se preocupar com diafragma e obturador e manter-se presente e atento à experiência? Como sustentar o campo de imanência do encontro expectador-artista de corpo aberto e operar um dispositivo complexo ao mesmo tempo?

Pesquisei em campo, e experimentei, os resultados foram diversos, e continuam sendo, a cada evento, um experimento incontrolável e caótico que me surpreende com questões novas.
Com o tempo, surgiram possibilidades novas de experiências e conexões, aos poucos tenho feito do diafragma da câmera minha própria pupila, o aparelho, como extensão do meu corpo, abre também seus poros para o acolhimento da experiência e compõe uma nova atitude de expectador ativo. Enxergar os eventos através de lentes objetivas transforma a experimentação, mas este acoplamento vai além do olhar, novos movimentos tiveram que ser possíveis, novas formas de respirar, um outro tipo de atenção é produzido, um novo corpo.


Assistir a eventos a partir deste acoplamento se tornou algo muito mais ativo, morre o expectador passivo e da lugar a produção simultânea do encontro! O acoplamento estrutural como dispositivo que auxilia na produção de um corpo sem órgãos do des-expectador, aumentando as possibilidades de acolhimento do caos e a tentativa de fazer deste encontro uma obra-de-arte!