Sempre gostei de fotografar, no entanto, nos eventos mais
importantes eu fazia questão de não levar câmera alguma, considerava o
dispositivo um empecilho ao acolhimento da experiência. Sempre impliquei com as
pessoas que vão em shows, exposições, os mais belos espetáculos, e passam a
maior parte do tempo preocupados em filmar/fotografar com seus
celulares/câmeras para o alto sustentados em posições esdruxulas. Penso que a
maioria das pessoas talvez ache melhor mostrar que foi ao show do que realmente
ter vivido o acontecimento. A experiência é perdida em detrimento de um
registro pobre cuja única utilidade é servir de vitrine e comprovar o
comparecimento.
Estava dividido, ou registrava digitalmente, ou vivia
(registrando corporalmente). E esta divisão eu vivia com uma angústia
adicional, quando calhar o registro, como fazer disso mais do que um
comprovante? Sempre procurei fazer do registro uma obra-de-arte, mas se eu só
registrava os eventos sem importância, eu não era capaz de me afetar o
suficiente para converter o fluxo documental em um fluxo artístico.
O dilema me pressiona então a levar os equipamentos a
eventos significativos. Mas como? Como
erguer aparelhos, se preocupar com diafragma e obturador e manter-se presente e
atento à experiência? Como sustentar o campo de imanência do encontro
expectador-artista de corpo aberto e operar um dispositivo complexo ao mesmo
tempo?
Pesquisei em campo, e experimentei, os resultados foram
diversos, e continuam sendo, a cada evento, um experimento incontrolável e
caótico que me surpreende com questões novas.
Com o tempo, surgiram possibilidades novas de experiências e
conexões, aos poucos tenho feito do diafragma da câmera minha própria pupila, o
aparelho, como extensão do meu corpo, abre também seus poros para o acolhimento
da experiência e compõe uma nova atitude de expectador ativo. Enxergar os
eventos através de lentes objetivas transforma a experimentação, mas este
acoplamento vai além do olhar, novos movimentos tiveram que ser possíveis,
novas formas de respirar, um outro tipo de atenção é produzido, um novo corpo.
Assistir a eventos a partir deste acoplamento se tornou algo
muito mais ativo, morre o expectador passivo e da lugar a produção simultânea
do encontro! O acoplamento estrutural como dispositivo que auxilia na produção
de um corpo sem órgãos do des-expectador, aumentando as possibilidades de
acolhimento do caos e a tentativa de fazer deste encontro uma obra-de-arte!
Oi Gushi!! Curti o texto. Vc não é tão ácido escrevendo. Nem te reconheço pela escrita. Pelo conteúdo do texto sim, mas pelo estilo não.
ResponderExcluirSeu texto provocou alguns pensamentos pq eu tb tenho essa incompreensão dos registradores passivos de eventos, etc. Gostei da parte "como transformar fluxo documental em fluxo artístico".
Ah! vc é uma mistura de ácido e doce. Tipo aquelas balinhas de minhoca.
Bjs.